Debate remoto realizado pela Assembleia Legislativa do Paraná ouviu médicos, especialistas e mães atendidas pelas doulas durante o período de trabalho de parto, parto e pós-parto. Audiência foi organizada para tratar do projeto de lei 388/2020 que tem os deputados Gilson de Souza, Goura e Mabel Canto como autores
A Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) realizou nesta terça-feira (29) uma audiência pública remota para debater a presença de doulas nos momentos de trabalho de parto, parto e pós-parto em hospitais do Paraná, prevista no projeto de lei 388/2020 que tramita na Alep. De maneira geral, os participantes apontaram que as doulas desenvolvem um trabalho importante e de grande relevância para as mães que são atendidas por elas, contribuindo para a humanização do parto e para o combate à violência obstétrica.
“Estamos promovendo este debate com vários representantes da sociedade. Temos doulas, mães, médicos, representantes de hospitais e da secretaria da Saúde, entre outros profissionais, que vão debater o tema conosco e, certamente, trazer sugestões para que a nossa proposta possa atender as necessidades das mulheres que desejam ter os seus filhos por meio de parto natural, com o acompanhamento de uma doula, considerando os benefícios desse apoio para o parto humanizado”, explicou o deputado Gilson de Souza, um dos autores desse projeto.
Pesquisas demonstram que o acompanhamento dessas profissionais tem reduzido em até 50% a taxa de cesáreas, diminuído em 20% a duração do trabalho de parto e em 60% os pedidos de anestesia. Além disso, foi registrada queda de 40% no uso de oxitocina e de fórceps. Por isso a importância desse projeto que é assinado pelos deputados Gilson, Goura e Mabel Canto, pois como não existe legislação estadual vigente sobre as doulas, muitos hospitais acabam restringindo e até proibindo a presença dessas mulheres, mesmo com autorização da família.
A presidente da Associação de Doulas de Curitiba e Região Metropolitana, Patrícia Teixeira, explicou que o movimento das doulas no Brasil começou efetivamente em 1978, no Rio de Janeiro, o que culminou com o resgate da humanização do parto e com a valorização do parto natural. Mas houve resistência dos profissionais de saúde. Foi somente em 2005 que esse trabalho começou em Curitiba.
“Em 2016, sentimos a necessidade de regulamentação. Em abril de 2017, foi fundada a Associação de Doulas de Curitiba e Região Metropolitana. Em abril de 2018, foi fundada a Federação das Doulas. Hoje temos a Associação de Doulas do Paraná. Estamos avançando, porque no Paraná, dez municípios já têm suas legislações, incluindo Curitiba. As doulas vieram para ficar. O projeto estadual será um importante passo para isso”, observou Patrícia.
A coordenadora do Núcleo de Promoção de Defesa dos Direitos da Mulher (NUDEN) da Defensoria Pública do Paraná, Lívia Martins Salomão defende que a mulher precisa ser respeitada. “A gente precisa pensar na mulher como protagonista no momento do parto e ela deve ser tratada com o respeito que merece. O que inclui o trabalho da equipe médica e, ao mesmo tempo, pensar nesse respeito é também garantir a presença das doulas no momento do parto”, disse.
Representando a Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do Estado do Paraná, Phillipe Fabrício de Mello afirmou que a Federação não se opõe à presença de doulas, mas reforçou a importância da regulamentação dessa prática. “Achamos que as legislações municipais já construídas não são as ideais. Por isso, será importante uma lei estadual que se sobreponha a elas e assim, o Paraná pode se tornar vanguarda nesse tema”, enfatizou.
A audiência também teve a participação de algumas mães que optaram pelo acompanhamento de doulas no momento do parto. “Foi a melhor escolha que fiz quando optei pelo trabalho de uma doula, em 2015, no nascimento do meu filho Teo. Eu queria ter a experiência do parto normal, pesquisei o assunto, conversei com a equipe médica sobre a minha vontade e encontrei uma profissional que compartilhou, comigo e com o meu marido, todo o seu conhecimento e também nos prestou assistência”, contou Andressa Daryê de Souza. “Fiquei preocupada ao observar as dificuldades impostas pelo hospital para que a Kátia, a doula que eu escolhi pudesse exercer o seu trabalho. É triste saber que existem instituições que impedem esse trabalho, que ainda tem preconceito a respeito das doulas”, lamentou.
Como representante da Federação das Santas Casas de Misericórdia e Hospitais Beneficentes do Estado do Paraná, Thalita Daiane Cândido, lembrou que 69 instituições integram a Federação e dedicam mais de 60% dos atendimentos aos pacientes do SUS. Ela ressaltou que a Federação também é favorável à presença das doulas e reconhece a importância dessas profissionais, mas sugeriu um cadastro, onde conste toda a documentação já prevista no projeto de lei.
Lenira Senesi, que representou a Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia do Paraná, apresentou um documento em nome dos ginecologistas paranaenses sobre o tema. Entre os principais pontos “a vedação de cobrança para o caso de atendimento a pacientes do SUS, espaços adequados para esse atendimento, paramentação e cadastro”. “Nós também engrandecemos o trabalho das doulas na humanização dos partos e no aumento de partos naturais, mas a regulamentação é fundamental”, alertou.
A audiência contou ainda com a participação do médico obstetra Braulio Zorzella, que coordenou maternidades do SUS, foi médico de UBS e maternidades públicas por oito anos. Para ele, a doula não substitui ninguém na equipe de parto. “Há uma horizontalidade nas funções de cada profissional. A doula é uma nova figura nesse contexto. Quem não concorda com a presença dela, precisa entender que a sua função é necessária para tornar o parto mais seguro para a parturiente. Mas concordo também que a discussão é importante, justamente porque é uma situação nova, mas devemos lembrar que representa o futuro do bem-estar das gestantes”, afirmou o Dr. Zorzella.
Patrícia Teixeira acredita que, no caso da regulamentação, o SUS precisaria arcar com os custos com o serviço. “Nós, doulas, temos esse ofício como ganha pão. E quando fazemos um contrato com uma gestante, estamos disponíveis para ela 24 horas”, alegou.
O deputado Gilson agradeceu a participação de todos. “Quero agradecer a todos que participaram conosco, que contribuíram com esse debate. Foi muito bom ouvir todas as pessoas, todas as instituições que as senhoras e senhores representam, pois queremos trazer para o projeto essas contribuições”, frisou. “Entendo que as doulas são profissionais preparadas para prestar assistência as mulheres nessa hora tão especial que é o momento do parto. Entendo também que as gestantes, as mamães precisam ter o seu direito respeitado de contar com o apoio que é prestado pelas doulas, por isso é importante a regulamentação, o cadastro dessas profissionais, para que seja valorizado esse trabalho”, defendeu.
“É importante que tudo isso seja avaliado e o nosso projeto, que se tornará a lei, seja uma lei efetiva e que realmente possa ser aplicada e assim as doulas e os hospitais possam trabalhar em perfeita harmonia”, finalizou o parlamentar.
Também participaram da audiência remota, irmã Iracema, diretora-geral do hospital Mater Dei; Paula Fernandes, fotógrafa de partos e ativista do parto humanizado; Cris Kutner, enfermeira obstétrica; Maria Isabel Corrêa, presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher; e a coordenadora de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Acássia Nars. Todas as considerações feitas, ao longo do debate, serão encaminhadas à Secretaria Estadual da Saúde (Sesa).